Dia do Cinema Nacional vem para relembrar o perfil da audiência brasileira
Em todos os anos, no dia 19 de junho é comemorado no Brasil o Dia do Cinema Nacional. Essa data foi escolhida porque neste mesmo dia, no ano de 1898, Afonso Segreto, um italiano radicado no Brasil, registrou as primeiras imagens em movimento do país na Baía de Guanabara, Rio de Janeiro.
Existem contestações por parte dos historiadores de que na verdade as primeiras imagens foram registradas na cidade de Petrópolis um ano antes, mas todo o folclore do pioneirismo acabou sendo construído ao redor do sobrenome Segreto e seus cinematógrafos.
Cinematógrafo presente no Instituto Lumière. Foto: Victor Grigas
No meio da celebração da semana do cinema nacional, um levantamento feito a partir da Agência Nacional do Cinema (Ancine) revelou os 10 filmes mais vistos no Brasil entre a década de 1970 até o ano de 2024, com base nos números de bilheteria. Embora seja um recorte temporal que não registra toda a história do cinema no país, já é o suficiente para estudar quais são as principais tendências do público brasileiro à frente de suas próprias produções.
Do 10º ao 4º colocado: elaboração de um panorama
O 10º colocado da lista já é um prelúdio de um gênero que foi estabelecido nos cinemas nacionais: a comédia. O Trapalhão nas Minas do Rei Salomão (1977) é um dentre vários filmes dessa franquia com os personagens Didi, Dedé, Mussum e Zacarias. Embora não tenham outros filmes dos Trapalhões nessa lista, tanto o programa de televisão quanto os 43 filmes lançados entre 1965 e 2017 representaram um marco na cultura brasileira.
Em 9º lugar, surpreendentemente, está o filme Ainda Estou Aqui, lançado no último ano. O filme fez um grande sucesso não só aqui, como fora do país, sendo inclusive o ganhador do Óscar de Melhor Filme Internacional em 2025. Além de ser um filme bastante recente, ele também é uma exceção à regra da lista, que conta em sua maioria com filmes de comédia.
Do 8º ao 4º filme da lista estão, em sequência: Se Eu Fosse Você 2 (2009), A Dama do Lotação (1978), Minha Mãe é Uma Peça 2 (2016), Dona Flor e Seus Dois Maridos (1976) e Minha Mãe é Uma Peça 3 (2019). À exceção de A Dama do Lotação, que é um drama que envolve abuso sexual, todos os demais filmes são comédias ou variações da comédia, como comédia romântica ou comédia dramática.
O pódio e a quebra do panorama
Analisando os outros filmes presentes na lista, talvez fosse confortável supor que as três primeiras colocações também seriam representadas por comédias. Entretanto, o pódio possui uma diversidade de gêneros totalmente diferente do que já foi observado.
Em terceiro lugar está o filme Tropa de Elite 2 (2010). A trama do Capitão Nascimento ganhou novos olhares, que ajudaram a corrigir alguns problemas presentes no primeiro, como uma certa visão heróica transmitida pelo protagonista, que acabou por gerar interpretações erradas pela mensagem que a obra gostaria de passar. A sequência superou o primeiro filme em muitos aspectos, como na direção, desenvolvimento de personagens e uma crítica ainda mais direta às instituições e personalidades do Brasil.
Em segundo lugar, de forma não tão surpreendente, está o filme Os Dez Mandamentos - O Filme (2016), uma adaptação da novela da Record de mesmo nome. No longa, acompanhamos a jornada de Moisés pela libertação do povo hebreu e é de se esperar que em um país em que a maior quantidade da população é católica ou evangélica, uma obra como essa movimente tantas pessoas, até mesmo aquelas que não tem o costume de ir ao cinema.
Na primeira colocação da lista, com uma tendência que se assemelha ao segundo lugar, está o filme Nada a Perder (2018), que é uma cinebiografia do bispo Edir Macedo, o influente televangelista e empresário que fundou a Igreja Universal do Reino de Deus e é também proprietário do Grupo Record.
Baseado nos dados desse levantamento fica bastante claro que a audiência brasileira adora assistir a comédias, cinebiografias e filmes bíblicos. As novelas e programas de TV ditaram durante décadas o sucesso dos filmes que seriam adaptados para o cinema, não só por movimentar a audiência, como também pela repetição dos mesmos atores conhecidos durante anos. Por consequência, vários padrões foram mantidos por conta da baixa representatividade de minorias nas telonas, o que não registra, no nosso cinema autoral, toda a diversidade étnica, cultural e religiosa que sempre fez parte da nossa história.
Tropa de Elite (2007). Reprodução: Universal Pictures
