Lei Maria da Penha faz 19 anos: avanços históricos, números alarmantes e o que ainda precisa mudar
A Lei Maria da Penha, sancionada em 7 de agosto de 2006, completou 19 anos ontem, em 7 de agosto de 2025. O marco legal foi um divisor de águas no enfrentamento da violência doméstica e familiar contra a mulher no Brasil — mas os desafios persistem e evoluem. Veja abaixo uma retrospectiva jornalística com os principais avanços, dados estatísticos e o panorama atual:
Avanços e impactos ampliados
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Ampliação da proteção jurídica
A lei institucionalizou medidas protetivas com maior rigidez, tipificando a violência doméstica como crime e autorizando o afastamento imediato do agressor — inclusive por policial, sem mandado judicial — uma evolução jurisprudencial significativa. -
Ampliação da cobertura sociocultural
A jurisprudência expandiu o alcance da lei para proteger mulheres trans e travestis, além de casais homoafetivos.
Dados recentes e desafios persistentes
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Magnitude da violência doméstica
Entre fevereiro de 2024 e fevereiro de 2025, cerca de 37,5 % das mulheres brasileiras (equivalente a 27,6 milhões) sofreram violência por parceiro íntimo — incluindo física (16,9 %), psicológica (31,4 %) e ameaça ou stalking (16,1 %). -
Estupros e feminicídios em alta
• Houve 87.545 casos de estupro em 2024, o número mais alto já registrado desde o início do levantamento em 2006; 76,8 % das vítimas eram crianças ou adolescentes até 14 anos, e quase 68 % dos crimes aconteceram dentro de casa.
• Foram registrados 1.492 feminicídios em 2024, com 80 % das vítimas mortas por companheiros ou ex-companheiros, e 64 % dos casos ocorrendo no domicílio — especialmente contra mulheres negras. -
Judiciário sobrecarregado
Em 2024, mais de 966 mil novos casos de violência doméstica foram registrados na Justiça, e foram julgados 10.991 processos de feminicídio, o maior volume desde 2020.
Barreiras estruturais
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Desconhecimento da lei
Em 2023, uma pesquisa do DataSenado apontou que apenas 24 % das mulheres afirmaram conhecer muito bem a Lei Maria da Penha — sendo que 75 % conheciam pouco ou nada. O índice de subnotificação é alto: 61 % das mulheres que sofreram violência não registraram denúncia à polícia. -
Relação entre escolaridade, renda e percepção da lei
Mulheres não alfabetizadas ou com menor escolaridade demonstram menos conhecimento e confiança na eficácia da lei: apenas 13 % conhecem bem a lei, contra 39 % entre quem possui ensino superior; e 32 % das não alfabetizadas acreditam que ela não oferece proteção contra 12 % entre as que têm nível superior.
Balanço e perspectivas futuras
Conquistas:
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A lei rompeu o tabu da violência doméstica, tornando-a crime público e pautando políticas de proteção e assistência.
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A ampliação da proteção para mulheres trans e LGBTQIAIA+ marca uma evolução de amplitude inclusiva.
Desafios:
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A violência permanece em níveis alarmantes, com feminicídios, estupros e agressões psicológicas em alta.
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A subnotificação e o desconhecimento da lei revelam falhas na disseminação de informação e acesso à justiça.
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Diferenças regionais e socioeconômicas continuam a dificultar o acesso efetivo à rede de proteção.
No seu 19º aniversário, a Lei Maria da Penha permanece como um avanço civilizatório essencial — mas convive com os fantasmas da desigualdade, da omissão institucional e do desconhecimento social. O país caminha, porém com passos lentos. A efetividade da lei depende de aprofundar sua disseminação, fortalecer as redes de apoio e investir em políticas intersetoriais que transformem a cultura de violência em cultura de respeito.
Fontes: Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM); DataSenado; Senado Federal; COAD — Consultoria Jurídica; Boletim DataSenado; Pesquisa Nacional sobre Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher.