Mont Serrat: o hospital que transforma o fim da vida em acolhimento e dignidade

Foto: Leonardo Rattes/Saúde GovBA
Em Salvador, na Bahia, um hospital público tem chamado atenção por mudar profundamente a forma como lidamos com o fim da vida. O Mont Serrat, inaugurado em janeiro de 2025, foi criado com um propósito muito especial: oferecer cuidados paliativos a pacientes com doenças graves, sem possibilidade de cura, dentro do Sistema Único de Saúde (SUS).
Localizado em um antigo casarão com vista para o mar, o hospital é o primeiro do país voltado exclusivamente para cuidados paliativos no SUS. Em vez de leitos de UTI ou equipamentos de reanimação, o que se encontra por lá são gestos de escuta, respeito e conforto. A missão do Mont Serrat não é prolongar a vida a qualquer custo, mas garantir que os últimos dias dos pacientes sejam vividos com dignidade, sem dor e cercados de afeto.
Um hospital que acolhe histórias, não só diagnósticos
São 70 leitos, todos destinados a pessoas em fase terminal. Cada paciente é acolhido como indivíduo — não apenas como alguém doente. Ao chegar, eles são convidados a compartilhar detalhes da vida: músicas favoritas, comidas que trazem boas memórias, histórias marcantes, times de futebol. Com isso, o cuidado vai além do físico — é também emocional, cultural e espiritual.
“Teve um paciente que se emocionou ao ver o mar da janela, lembrando os tempos em que trabalhava em faróis. Outro, que chegou muito debilitado, disse se sentir em casa pela primeira vez em muito tempo”, conta a médica Karoline Apolônia, que coordena os cuidados no hospital.
O que são os cuidados paliativos?
Cuidados paliativos são uma abordagem voltada para melhorar a qualidade de vida de pessoas com doenças que ameaçam a vida. O foco está no alívio da dor e do sofrimento, seja ele físico, emocional, social ou espiritual. Diferente do que muitos pensam, não se trata de "desistir" do paciente, mas sim de oferecer um tipo de cuidado que respeita a finitude da vida e valoriza o tempo que ainda resta.
No Mont Serrat, uma equipe multidisciplinar — composta por médicos, enfermeiros, psicólogos, assistentes sociais, terapeutas ocupacionais, entre outros — atua de forma integrada para atender tanto o paciente quanto a família. Não há lugar para o tabu da morte. Em vez disso, há espaço para a escuta, para o silêncio, para as despedidas feitas com respeito e serenidade.
Ortotanásia: uma escolha ética e humana
O hospital não realiza eutanásia (ato de abreviar a vida de forma ativa), prática proibida no Brasil. O que se adota é a ortotanásia: permitir que a morte aconteça no tempo natural, sem prolongar artificialmente a vida com intervenções invasivas e dolorosas. Ao mesmo tempo, todos os sintomas — como dor, falta de ar ou angústia — são tratados com cuidado e conhecimento técnico.
“Ainda existe uma ideia equivocada de que cuidados paliativos significam deixar de cuidar. É justamente o contrário. A gente cuida de tudo que ainda importa: da dor, das emoções, das memórias, da presença da família. A vida é valorizada até o fim”, afirma Karoline.
Um modelo que pode inspirar o Brasil
A proposta do Mont Serrat tem sido reconhecida nacionalmente e pode servir como exemplo para outras cidades brasileiras. Em tempos em que a morte muitas vezes é vista como um fracasso da medicina, o hospital mostra que é possível criar um ambiente de paz, empatia e humanidade para quem está partindo.
Mais do que um hospital, o Mont Serrat é um lugar onde a vida é celebrada até o último instante.
Com informações do Portal Aqui Vale