Dentro da Cena com Ed Goma, líder da Escravos da Merenda e um dos percursores do Punk em Vitória da Conquista

Ed Goma no estúdio da Mega Rádio. Foto: Danilo Souza
  • Danilo Souza
  • Atualizado: 20/05/2025, 07:28h

Quem nunca foi para a escola, mesmo desanimado, só porque sabia que a merenda seria boa, atire a primeira pedra. Ou então traga sua vasilha, porque hoje o papo vai ser com os Escravos da Merenda, mais especificamente com o Ed Goma, vocalista e baixista do trio, e que também é um dos membros originais da primeira formação da banda surgida há mais de dez anos. Joanderson Felix e Lázaro Amaral completam a atual formação do grupo.  

Nesta entrevista, Danilo Souza e Ed falam sobre a história do trio punk, a cena do estilo em Vitória da Conquista, os anos de estrada até a gravação do primeiro disco e o que há de novo após a chegada dos novos integrantes.

O Dentro da Cena é produzido e apresentado por Danilo Souza com apoio e publicação da Mega Rádio.

Danilo: Como surgiu a banda e esse conceito de ser um “escravo da merenda”? 

Ed:  A banda começou em 2013, especificamente no dia 21 de abril de 2013, formada por mim, Ed Goma, na bateria e vocal, Anderson Silva, baixista, e Luiz Ludwig, que era o guitarrista. A gente já tava no cenário, a gente toca desde 2000, 2001, 2002… Anderson tinha ido pra São Paulo e acabou voltando, aí a gente sempre se encontrava, todo mundo, ali no [bairro] Guarani e [bairro] Ibirapuera, também tem Simpson, a gente andava muito na casa de Simpson, ali era o núcleo da coisa toda.

Aconteciam shows, né? Ia rolar um show em Poções, a Cama de Jornal ia tocar, aí eu acho que uma banda faltou lá e a gente tava ensaiando aleatoriamente, não tinha banda não. Nem [vocalista da Cama de Jornal] falou, “faltou uma banda lá, poderia colocar vocês, vocês não querem tocar não?”, e a gente topou. Eu falei, “então beleza, pode botar a gente”, mas não tinha nome a banda. No último ensaio, a música que a gente tocava era Escravo da Merenda, aí como a gente tava tocando a música, acabou ficando Escravos da Merenda como o nome da banda a partir desse dia. Foi daí que surgiu essa coisa toda.

Danilo: A banda está em atividade oficialmente na cena de Vitória da Conquista desde abril de 2013, o que faz com que vocês sejam um dos grupos mais longevos de punk aqui na cidade. Fazendo uma brincadeira e uma alusão à merenda, qual é o “ingrediente” que sustenta a Escravos há tanto tempo?

Ed: Amizade. Hoje só eu que estou da formação que formou [a banda], mas ainda mantive a amizade com o pessoal que saiu. Era amizade mesmo. E despretensão, [a gente] fazia porque gostava, era uma razão para se juntar também. Ter tempo também, gostar do que faz e contar com pessoas que estejam afins ali no mesmo pensamento. Banda de rock é isso aí, é essa coisa, pelo menos o underground, eu acho. Essa coisa de amizade e gostar do que faz.

Formação original da Escravos da Merenda. Da esq. para dir.: Luis Ludwig, Ed Goma e Anderson Silva. Foto: Escravos da Merenda

Danilo: Doze anos não são doze dias, ainda mais sendo um trio punk. Quais memórias você tem ao pensar na história do Escravos da Merenda até aqui? Há outras bandas da cidade e da região que se interligam nessa trajetória?

Ed: A Escravos da Merenda, para além das outras bandas que eu toco, das outras coisas que eu faço, das coisas que eu vivo, é uma das coisas que ultimamente mais me deu alegria de estar fazendo, estar vivo e tal. É uma coisa que eu gosto muito de fazer, é onde eu descarrego essa coisa da arte, além das outras bandas, mas a Escravos da Merenda é a que eu tô mais me dedicando e ultimamente tem acontecido coisas boas assim também.

A gente, desde a formação, faz parte desse underground de Conquista e tocamos em algumas coisas marcantes que teve aqui. Na Casa do Rock, eu esqueci o ano, mas entre 2011 até 2013, tocamos no Point do Rock, tocamos no Agosto de Rock, em alguns shows em Poções, Itapetinga também. Então demos um giro aí pela região, além de tocar aqui na cidade. A gente tocou quase todos os anos, pelo menos uma vez no ano. 

Danilo: Ao longo deste tempo, as formações foram mudando e você permaneceu como o único membro original da banda. Apesar disso, no primeiro álbum da Escravos, lançado em 2023, Luis Ludwik e Anderson Silva, os dois outros membros da primeira formação, aparecem creditados como intérpretes e compositores. Como foi gravar o disco de estreia ao lado das pessoas que fizeram parte da história da banda desde o início? 

Ed: As músicas do primeiro álbum são todas parcerias. A maioria é minha, do Luis, aí tem Anderson também, tem Kétia Damasceno, que é do Operakata, tem Simpson, tem Junior Rugal também…Tinha que ser eles para registrar essa formação, eu acho que é fazer justiça e ter mais aquela cara da banda mesmo, mostrar como era da forma original a pegada da banda. Tinha que ser eles, eu sempre bati nessa tecla.

Eu fechei um ciclo com satisfação. [O disco] não é uma gravação no metrônomo, não é uma gravação músico por músico, foi todo mundo tocando ao vivo, uma gravação de ensaio, só que com qualidade, e foi isso, foi de forma underground e satisfatória. 

Ed Goma no estúdio da Mega Rádio. Foto: Danilo Souza

Danilo: Hoje, dando continuidade a trajetória da Escravos da Merenda, agora com novos membros (Joanderson Felix, na bateria, e Lázaro Amaral, na guitarra), aquela fome do início para fazer arte continua a mesma? Os meninos trouxeram um “tempero novo” para a merenda?

Ed: Sim, eles me salvaram, né? Luiz teve que se afastar, Anderson também se afastou. Joanderson eu conheci na universidade, a gente fazia o curso de História e ele ia nos rock and roll, me via e a gente se via ali e falava, e Lázaro eu conheci em outra banda. 

Apesar de que eu tenho essa questão de composição, uma veia pra isso, eles estão pegando esse bonde andando, mas estão dando uma cara deles ali, que acaba sendo a pegada de cada um. Ninguém tem a mesma pegada igual, então, de certa forma, dá uma roupagem nova. Eu percebo também nas composições que já é outra pegada. Com a saída dos antigos componentes, você acaba vendo a diferença nas composições que vão surgindo.

Formação atual da Escravos da Merenda. Da dir. para esq.: Lázaro Amaral, Joanderson Felix e Ed Goma. Foto: Escravos da Merenda

Danilo: Com essa formação, vocês têm aparecido cada vez mais em festivais aqui da cidade, a exemplo do Agosto de Rock, o Conquista Punk Rock e o Conquista Alternativa. Qual a sensação de ter o trabalho reconhecido e lembrado para estar nesse circuito das apresentações ao vivo? 

Ed:  Eu nunca saí do palco, nunca saí da cena. Talvez a novidade seja pros meninos, porque além de tocar nessas bandas que eu falei, eu sempre tava em uma, quando uma não tocava, eu tava tocando com a outra e não tinha jeito, tanto nos shows de rock underground, festival ou em barzinhos mesmo. 

Mas é muito bom tocar. [Teve o] Agosto de Rock, que voltou aí recentemente depois de vinte anos, bom também, o Point do Rock, que já é a marca daqui da cidade. Só fazendo parte da cena mesmo e contribuindo para ela e, de certa forma, sendo reconhecido pelo público e pelo pessoal do evento. É isso, é só fazer o que tem que fazer mesmo, de coração, com vontade.

Danilo: Ainda pensando nesse circuito de festivais locais, ao comparar com outras décadas, houve uma evolução na qualidade e na quantidade desses eventos?

Ed: Antigamente tinha mais shows de rock, mais festivais, mais eventos, o próprio Agosto de Rock, tinha o Babilônia, tinha o Rock Vertente, Rock de Subúrbio, tinha Rock In Concert, Noites Fora do Eixo, enfim… Tinha muito espaço para fazer isso, poderia fazer em estacionamento, no [teatro] Carlos Jehovah, Centro de Cultura, escolas, praça e tudo. 

Hoje já não se vê essa quantidade de lugares de espaço público para fazer esses shows de rock ou, quando tem, estão fechados, que é o caso do Carlos Jehovah. Para fazer em outro lugar tem a burocracia, a questão de vizinhos, a questão de valor… Mas é isso, hoje tem qualidade, mas não tem quantidade. Antigamente tinha quantidade, não tinha tanta qualidade, eu falo do ponto de vista de instrumental mesmo, de som. Não que aquilo era ruim, mas aquela questão de qualidade, de tecnologia, de aquisição de um instrumento melhor, de um som melhor, de pessoal mais capacitado para isso, tanto o músico quanto o produtor, né? Eu acho que a diferença é essa.

Danilo: E de que modo você enxerga a cena atual?

Ed: Hoje tem a gente, tem Simple Jeans, tem Signista, Outra Conduta, Cama de Jornal, Renegados, Mictian, Headless Queen, que tão lançando coisas. E a Dona Iracema, que tá mais em destaque, sempre tá tocando fora. Pela quantidade, [comparado com] antigamente, hoje tem menos banda, mas tem muita banda fazendo coisa, produzindo clipes, música, gravando CD, tocando.

Danilo: Ao anunciar apresentações no Instagram da banda, você costuma dizer a frase “traga a vasilha” para os ouvintes e seguidores. Acredito que, para eles, a hora do show é como a hora da merenda na escola, o momento mais esperado. O que os fãs da Escravos podem esperar para esse ano? Vocês continuam na estrada pro ao vivo ou estão compondo coisas novas?

Ed: O cara que colocou isso na cabeça [“traga a sua vasilha”] é o Vitor Quadros, ele sempre falou esse bordão, não sei se é do carro do sorveteiro [“Vai passar o sorveteiro, três bolas de sorvete, um real, traga a vasilha”], eu acho que vem dali. É um bordão que encaixa bem pra banda. 

Um pessoal do curso de cinema da UESB entrou em contato com a gente para fazer um mini-documentário sobre a banda. Além desse documentário, a gente vai tentar gravar o segundo disco com essa formação agora, não sei quando, mas é isso aí. Vamos tentar lançar um videoclipe, gravar esse segundo disco e esse documentário por enquanto.

Danilo: Depois de falar de música, a pergunta que não podia faltar: qual era sua merenda favorita na escola?

Ed: Eu gostava de suco de cajá, do pão com carne, do toddy com bolacha. Eu acho que gostava de tudo, a maioria eu curtia. 

Danilo: Eu estudava em escola pública, quando tinha esse dia do pão com carne, assim, era coisa de formar fila (risos).

Ed: É, e barrava de repetir, porque senão não dava pra todo mundo, todo mundo queria... E tem outras que o pessoal dispensava mais e acabava virando bagunça. Bolacha mesmo, começava a jogar um no outro. É complicado (risos).

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